Resumo: |
A pesquisa propôs-se a uma análise do cotidiano da população santacruzense no século XIX, objetivando compreender como as mudanças civilizadoras ocorridas no oitocentos afetaram esta sociedade rural, implantada no interior do país, considerada uma região periférica, isolada do eixo econômico agroexportador nacional. Com isto procuramos também verificar até que ponto a máxima do litoral/urbano civilizado e interior/rural rude e ignorante apresentada pela historiografia reflete o período em questão. O trabalho tem como base a interdisciplinaridade, aqui refletida na convergência de duas ciências até a pouco tempo isoladas em seus próprios princípios, a Arqueologia e a História, mas que juntas tem se revelado um caminho pleno de possibilidades para estudos de natureza sociocultural. Através da combinação das fontes: a cultura material descrita nos inventários e exumada nos sítios arqueológicos de unidades habitacionais rurais e outras documentações escritas, buscou-se uma melhor forma de aproximação em relação aos processos culturais envolvidos nas atividades diárias, bem como nas práticas sociais da sociedade santacruzense oitocentista, e assim perceber como esta população se posicionou diante dos novos padrões comportamentais disseminados pela proximidade com a Corte portuguesa. Na vila de Santa Cruz as imposições políticas, observadas nas normas estabelecidas no Código de posturas, traziam para mais perto das pessoas as preocupações higienistas e ordenadoras do Império brasileiro. Assim a população urbana esteve mais envolvida com as mudanças civilizadoras. Este envolvimento está explícito no seu comportamento de consumo, na presença constante de objetos que conferissem ao seu portador certo grau de distinção e civilidade. Na zona rural a tralha doméstica compunha-se por artefatos cerâmicos de fabricação local, provavelmente confeccionada pelos próprios componentes da unidade doméstica. Ao mesmo tempo observou-se uma quase ausência de objetos importados. Todavia a utilização de uma cerâmica diferenciada, aparece nestes sítios como um substituto aceitável e mais acessível, visto que sua função no domicílio rural parece ser a mesma da louça nas habitações urbanas. A pesquisa demonstrou que mesmo diante das dificuldades impostas pela economia agrícola de subsistência, a população santacruzense, não pode ser descrita como rude, ignorante e incivilizada, isolada da nascente civilização brasileira, como difundido pela historiografia para os habitantes do interior do país no oitocentos. De acordo com suas possibilidades, tanto os habitantes da vila quanto da zona rural, procuraram adequar-se às novas tendências, civilizadoras, de seu tempo. Seja através do consumo de alguns artigos de além mar, seja na substituição de um produto de alto valor por um outro, de custo mais baixo. |