Resumo: |
Ritos de magia e sobrevivência tem como tema central as manifestações mágico-religiosas em seus nexos com a história social do Brasil e de São Paulo dos últimos anos do século XIX às primeiras décadas do século XX. A temática foi sugerida inicialmente pelo nosso trabalho de mestrado e pela documentação criminal da segunda metade do século XIX que chamou a atenção para a importância de uma religiosidade difusa, no geral oriunda das crenças afro-brasileiras, no processo de luta contra a reificação pretendida pelo regime da dominação escravista e por seus efeitos no pós-Abolição. Impregnada na organização do dia-a-dia das populações urbanas e rurais, muitas delas oriundas da condição escrava, manifesta na ação de curandeiros, feiticeiros, pitonisas e benzedeiras, insinuou a força de uma sensibilidade religiosa que se transformava muitas vezes em componente essencial de processos cognitivos e de uma concepção de mundo capaz de fornecer os referenciais para que tais grupos pudessem pensar a sua condição social e se compatibilizar com a sociedade mais ampla. De outra parte, nos quadros das transformações que se operavam no período, não se tratava de uma simples permanência de ritos e crenças, em continuidade com as tradições do catolicismo popular e dos ritos afro-brasileiros, mas de um processo de acentuada revivescência das mais variadas correntes de pensamento mágico e místico, denotando em outros termos os ritmos e as direções dos processos históricos em curso. A história dacidade nessa época, marcada pelo crescimento espantoso do número de habitantes, vinha inscrita também no alastramento das vertentes do pensamento espiritualista: a difusão do espiritismo, as teorias e práticas relacionadas ao magnetismo animal, a ciência do ocultismo, a quiromancia e a cartomancia mesclavam-se às tradições existentes e acabavam por moldar práticas e figuras multifacetadas. Além disso, aludiam ao clima de insegurança social, à mobilidade de contingentes populacionais imigrantes, migrantes e negros, às oscilações implícitas nos processos históricos em curso e, indiretamente, ofereciam um quadro revelador do custo social da urbanização e da modernização. Emprestando os termos de Oswaldo Xidieh (1944), senhores e senhoras em idade provecta, negras velhas e macumbeiros, parteiras e carolas, curandeiros e benzedeiras, rezadores e tiradores de cobra, capelães e cozinheiras, amas-secas e mumbavas, crias e cantadores, folientos do Divino, penitentes andarilhos e beatas são os sujeitos desse estudo |